Era uma vez, uma menina muito bonita e graciosa. Filha única, que teve a infelicidade de ficar órfã de mãe. Seu pai era ainda muito moço e casou-se novamente, com uma viúva que tinha uma filha mocinha, muito feia e orgulhosa. A madrasta, na presença do marido, tratava bem a enteada. Mas, como o marido vivia viajando, vingava-se da mocinha, obrigando-a a fazer trabalhos pesados, como lavar louça, limpar a estrebaria, o galinheiro, a casa inteira, etc.. A mocinha começou a viver amargurada e sofrendo toda a espécie de privações e insultos. De tanto padecer, perdeu a paciência. E achou que o remédio era fugir daquele purgatório.
Antes de tomar tal decisão, a moça rezava, todas as noites, a Nossa Senhora, que era sua madrinha, pedindo que lhe ensinasse os caminhos do bom proceder. Então, Nossa Senhora transformou-se numa velhinha. E falou com ela no caminho do rio, explicando-lhe tudo. Abençoou-a e lhe deu uma almofadinha de ouro, que era encantada. Quando precisasse de alguma coisa, pedisse à almofadinha de ouro, que fora dotada de poderes de Deus.
Deixando a casa, a mocinha andou muitos dias, com fome e sede, mas acabou encontrando trabalho, num palácio vistoso, residência de um príncipe solteiro e muito agradável.
A moça, para não causar suspeitas e não despertar maldades, sujou o rosto. E andava tão imunda que só lhe deram o serviço de tratar das galinhas e dos porcos. Dormia no fundo do quintal, num quartinho escuro e isolado do palácio.
Dia vai e dia vem, anunciaram três dias de festa no palácio. E toda gente se entusiasmou, preparando roupas novas, encomendando os arranjos e fazendo cálculos. O príncipe era um dos mais alegres, e as moças da cidade desejavam que ele se engraçasse por uma delas, por ocasião da festa.
Chegando ao primeiro dia da festa, o príncipe foi para o baile. E os empregados do palácio fugiram, para ver as luzes e a entrada das pessoas que iam dançar. A princesa-velha, mãe do príncipe, foi também.
Ficando sozinha, a moça tomou banho, penteou-se e pediu à almofadinha de ouro que lhe desse um vestido cor do campo, com suas flores, e uma carruagem de criados.
Apareceu incontinenti o pedido. E a moça vestiu-se e foi à festa. Lá, causou a todos assombro, por sua formosura e beleza do traje. O príncipe largou todas as outras e só dançou com ela. Como lembrança do encontro, deu-lhe um presente de um anel. Perto da meia-noite, a moça desaparecera. Fugiu para seu quarto, onde trocou de roupa. O vestido e a carruagem sumiram.
No segundo dia da festa, aconteceu a mesma coisa. A moça levou um vestido cor do mar, com todos os seus peixinhos. E o príncipe ficou encantado por ela, dançando com ela, servindo-a e conversando com ela. Deu-lhe um par de brincos. Antes da meia-noite, a moça não foi encontrada em parte alguma. Já estava em seu quarto, suja e feia, como habitualmente aparecia aos olhos de todos.
No terceiro dia da festa, a mesma coisa aconteceu. Mas, daquela vez, o vestido era cor do céu, com todos os seus astros. E a moça ofuscava os olhos de todo mundo, pelo brilho das joias. O príncipe só faltava gritar de contente. Presenteou-a com um colar. Mas ficou triste quando ela despareceu antes da meia-noite.
Passados os três dias da festa, só se falava, por toda a cidade, naquele assunto, da moça desconhecida, com os três vestidos mais bonitos do mundo. O príncipe procurou-a como um cego procura a luz. Mas não a encontrou em parte alguma. E, de tanto apaixonado, adoeceu. Trancou-se no quarto. E ele só deixava lá entrar a sua mãe. Todo mundo se lastimava por causa da doença súbita do príncipe. E os médicos não tinham mais remédio que servisse a fim de curar o príncipe.
O coitado do príncipe nem queria mais comer nada. E a princesa-velha fazia as maiores promessas, para que o filho se alimentasse, fosse como fosse.
Um dia, a moça disse à princesa-velha que queria fazer um bolo para o príncipe doente. A princesa achou graça no atrevimento daquela pobre moça. Mas, de tanto a moça lhe pedir e até lhe rogar, obteve da mãe do príncipe o seu consentimento.
Assim, a moça se preparou, foi para a cozinha e fez um belo bolo dourado. E colocou, dentro da massa, o anel que o príncipe lhe dera, na primeira noite do baile.
O príncipe nem queria ver comida alguma. Mas a sua mãe tanto lhe pediu que ele cortou um pedaço do bolo. E, ao levá-lo à boca, reparou um objeto que aparecia na parte restante do prato. Puxou desconfiado, com a ponta da faca. E reconheceu aquele anel que havia dado àquela linda moça do baile. Aí, comeu todo o bolo. E chegou a melhorar um pouco. E declarou à sua mãe que queria outro bolo, feito pela mesma pessoa.
A moça fez de novo outro bolo. Só que, nesse outro, ela mandou os brincos, que o príncipe achou dentro do bolo. E logo ele ficou certo de que a moça estava por perto. Aí, ele pediu, mais uma vez, à sua mãe outro bolo. E, nesse terceiro bolo, veio o colar dentro dele. Então, sem ter mais um pingo de dúvida, o príncipe disse à princesa-velha que mandasse trazer ao seu quarto a pessoa que havia feito os três bolos.
A mãe do príncipe obrigou a moça mudar de roupa, a perfumar-se, para tirar o mau-cheiro do galinheiro, e lhe disse que se apresentasse ao filho.
A moça subiu as escadas com a almofadinha de ouro na mão. E, assim que bateu à porta do quarto, pediu à almofadinha que lhe aparecesse no seu corpo o vestido do terceiro dia de festa, dos pés à cabeça.
Quando a porta se abriu, e ela entrou, o príncipe deu um grito tão alto, de tanta alegria, chega se levantou de vez da cama, bonzinho de saúde. E gritou pela mãe. E lhe mostrou a moça, que estava mais bonita ainda do que nas noites anteriores.
Casaram-se imediatamente, depois que a moça lhes contara toda a sua história. E, assim, foram felizes até a morte.