Numa noite chuvosa, daquelas de fazer horror, estavam três fadas cumprindo o seu fado no jardim, que ficava ao lado da casa de Barceloz, que era namorador das flores em botão, e o qual levava as noites todas velando. Como eram, por esse motivo, as fadas privadas de cumprirem com sua missão naquele lugar, combinaram encantar Barceloz, na ocasião em que ele estivesse namorando o bogari.
Apareceram, numa noite tenebrosa, as três fadas. E foi na ocasião em que chegava o moço à janela. Puseram-se elas a julgá-lo. Dizia a primeira:
- Esse nos tem atrapalhado. Pois ele irá, durante sete anos, não conseguir falar. E só vai ter essa flor, para o seu sustento.
A segunda disse:
- Nesse tempo, ele se tornará num mato virgem, e não aparecerá uma viva alma nestes ermos, durante os sete anos.
A terceira disse:
- Ele só há de ser desencantado pela filha da Peregrina, aquela que está cumprindo a mesma pena.
Ditas essas palavras, Barceloz se encantou. E também a casa e todos que nela existiam. Quando Barceloz estava com seis anos de encanto, a Ninfa, filha da Peregrina, completou os sete, e seguiu o mesmo destino de sua mãe, retirando-se em direção ao Reino da torre de ouro.
Anoitecendo no meio do caminho, e sendo noite escura e chuvosa, Ninfa, como mulher, teve medo de ficar nas matas medonhas. E continuou a andar, para ver se encontrava alguma casa. Perdendo a esperança de encontrá-la, procurou uma árvore bem copada e agasalhou-se debaixo dela, à espera do sol. Alta noite, as fadas chegaram. E, então, disse a primeira:
- Fademos, manas, fademos. No Reino da torre de ouro, tem de haver uma grande festa. E tem de se fazer uma escolha, para desencantarem a mata que foi Barceloz, o Campo Negro e a Bela das Belas. Esses três reinos nos têm de ser desencantados pelas três Peregrinas. Ninfa desencanta Barceloz.
A Morena desencanta a Bela das Belas. E Nandi, o Campo Negro. Aí, Ninfa, que estava presente, ouviu toda a conversa. Então se pôs quieta e assustada.
Ao romper do dia, Ninfa se pôs a caminho. E chegou trêmula de fome, à beira de um rio, onde estava uma velha, lavando roupa. A velha disse:
- Minha netinha, o que faz você por aqui? Como você é tão bonitinha! Eu quero levar você para a minha casa. Quer morar comigo?
A moça respondeu-lhe:
- Não, eu não posso ficar morando. Eu posso é ficar uns dias, para eu descansar da viagem.
- Pois eu, disse-lhe a velha, eu só quero ter o gosto de ver você lá em minha casa.
Seguiram ambas. Chegando lá, elas se depararam com todas as coisas da casa a tinir, como se fossem repiques de sinos. E a Ninfa ficou pasmada, por ouvir tanto rumor à sua chegada. A velha, então, lhe respondeu:
- Isso é meu filho, que te desconheceu.
A velha apresentou Ninfa ao filho. E ele logo lhe perguntou para onde ela estava indo.
- Eu estou indo, respondeu-lhe a moça, ao Reino da torre de ouro. Eu estou indo desencantar um infeliz, que está encantado no Reino das Matas.
Disse-lhe, então, o monstro:
- Ainda este ano, você não chegará lá. E pode ir descansada, porque você não vai desencantar Barceloz. Um beija-flor que ele tem, e que vive a beijar o bogari, ele poderá matar você. E também há uma serpente, ao pé da janela, que só de vê-la mete medo a qualquer um. Mas, como minha mãe gostou muito de você, eu vou lhe dar alguns esclarecimentos. Você vai levar este bogari e esta bola de vidro. Tome cuidado, pois você vai achar, por estes dois objetos, uma grande quantia. Não venda nenhum deles. Ah, o rei também vai querer comprá-los. Não venda, ouviu bem. E, para você chegar até Barceloz, deverá ser ao meio-dia, que é a hora em que o beija-flor terá ido à fonte, e a serpente estará dormindo. Aí, você ponha a flor na boca de Barceloz, e a bola na boca da serpente. E espere o beija-flor chegar. Na chegada dele, tire a flor do ramo e guarde. Quando o passarinho beijar a flor que está na boca de Barceloz, o passarinho cai, e a serpente acorda e quer mordê-lo, mas termina ela quebrando os dentes na bola. Barceloz, então, se desencanta, aparece o palacete. Não se esqueça de tirar do dedo do moço um anel. Você deverá guardar o anel para que, quando for chamada pelo rei, o anel vai servir de sinal, para você se casar com o moço, vencendo, assim, as invejosas.
Assim fez a Ninfa. Depois de tudo acabado, foi ela até a presença do rei. Na ocasião, todos os sábios do rei duvidaram de que aquela moça tivesse feito uma ação daquela natureza. Aí, a Ninfa mostrou o anel a todos os presentes, e todos o reconheceram.
De repente, chegou apressada uma mulher, dizendo ao rei que foi ela que tinha desencantado Barceloz. E a Ninfa foi condenada à morte. Mas só foi livre da morte porque a mulher não apresentou prova alguma. E, então, aquela mulher é que foi condenada à morte. E, assim, Ninfa se casou com Barceloz e houve uma grande festa, que ninguém havia visto até então no reino.