Era um dia um viúvo que tinha uma filha muito boa e bonita. Vizinha ao viúvo residia uma viúva, com outra filha, feia e má. A viúva vivia agradando a menina, dando presentes e bolos de mel. A menina ia simpatizando com a viúva, embora não se esquecesse de sua defunta mãe que a acariciava e penteava carinhosamente. A viúva tanto adulou, tanto adulou a menina que a menina acabou pedindo a seu pai que ele se casasse com a viúva:
- Case com ela, papai. Ela é muito boa e me dá mel.
- Agora ela lhe dá mel, minha filha, amanhã ela vai lhe dar fel. - respondia o viúvo.
A menina insistiu, insistiu. O pai, para satisfazê-la, casou com a viúva. Mas, obrigado por seus negócios, o homem viajava muito, e a madrasta aproveitou essas ausências para mostrar quem era. Ficou muito bruta e malvada, tratando a menina como se fosse um cachorro. Dava-lhe pouco de comer e botava-a para dormir no chão, em cima de uma esteira velha. Depois ordenou a menina fazer os trabalhos mais pesados da casa. E quando não havia coisa alguma para a menina fazer, a madrasta não a deixava brincar. Mandava-a vigiar um pé de figos que estava carregadinho, para os passarinhos não bicarem as frutas.
A pobre menina passava horas e horas guardando os figos e, quando algum passarinho voava por perto, ela gritava: “Xô, passarinho!” Mas, numa tarde, a menina estava tão cansada que adormeceu. E, quando acordou, os passarinhos tinham picado todos os figos. A madrasta veio ver e ficou doida de raiva. Achou que aquilo era um crime. De tanta raiva, matou a menina e enterrou-a no fundo do quintal. Quando o pai voltou da viagem, a madrasta disse que a menina havia fugido de casa e andava pelo mundo, sem juízo. O pai ficou muito triste.
Em cima da sepultura da órfã, nasceu um capinzal bonito. O dono da casa mandou que o empregado fosse cortar o capim. O capineiro foi pela manhã e, quando começou a cortar o capim, saiu uma voz do chão, cantando:
“Capineiro de meu pai, /não me cortes os cabelos. / Minha mãe me penteou, /minha madrasta me enterrou, / pelo figo da figueira / que o passarinho picou. / Xô! passarinho!”
O capineiro deu uma carreira, assombrado, e foi contar o que ouvira. O pai veio logo e ouviu as vozes cantando aquela cantiga tocante. Cavou a terra e encontrou uma laje. Por baixo, estava vivinha a menina. O pai, chorando de alegria, abraçou-a e levou-a para casa. Quando a madrasta avistou de longe a enteada, saiu pela porta afora, e nunca mais deu notícias se era viva ou morta.
E, assim, o pai ficou vivendo muito bem com sua filhinha.