Contam que, certa vez, existiam um homem e uma mulher que tinha uma filha muito bonita. Os dois, com muito medo de que algum rapaz a roubasse, traziam-na sempre trancada a sete chaves. A coitadinha vivia escondida nos quartos e nos cantos da casa. Não podia ir à janela, não chegava nem sempre perto do quintal, não ia à lugar algum.
Certo dia, uma escrava da casa foi à fonte buscar à água, a fim de pô-la na panela da comida, que estava no fogo cozinhando. E, ao chegar lá, viu um beija-florzinho cantando, aponto de rebentar ousado num galhinho seco, bem no alto da árvore:
“Esperança, esperança, / hum, hum, / ta…tá…tá-lê-lê, / sentada na cazumba /Helena Pereira /hum, hum…”
A negra achou aquela cantiga tão bonita que arreou o pote. sentou-se e pôs-se a escutar o bichinho, admirada, sem se lembrar de mais nada.
Vendo que a escrava demorava muito na fonte, a mãe da moça mandou outra negra, a fim de ver por que motivo ela não vinha com a água. A segunda escrava foi e também ficou sentada, a ouvir o passarinho.
Assim, afinal de contas, foram todas as escrava e escravos grandes e pequenos, ficando todos na fonte, de bocas abertas, escutando o beija-flor cantar.
Por último, foi a mãe da moça, que também não voltou. Depois de passado muito tempo, a moça, vendo que a panela estava esturricada, pegou um xale, embrulhou-se toda e desceu a caminho da fonte. Quando a moça foi chegando, diante de todos os que olhavam espantados, o beija-flor, ao vê-la, voou para cima dela, agarrou-a e, num abrir e fechar de olhos, desapareceu com ela pelos ares.