Um índio da tribo Caxinauá, muito bonito chamado Dunu-nawa (gente-de-cobra) casou-se com uma mulher chamada Pai (o nadar do peixe).
Depois de algum tempo que estavam casados, Dunu-nawa começou a fazer uma porção de flechas, muito bem feitinhas. Quando acabou de fazer as flechas, trançou cordas e fez os arcos. Depois, afiou bem as pontas das flechas e enfeitou a haste com penas coloridas. Para isso, usou penas do gavião pega-macaco, do mutum, do urubu, do jacu e do jujubim. Aparou as penas todas bem iguaizinhas. E amarrou-as com fios, que antes esfregara na cera. Quando já tinha acabado de fazer tudo, a mulher chegou perto dele e lhe disse:
- Meu marido, não quero mais comer frutas e legumes. Estou com fome de comer carnes. Vá matar alguma caça para mim.
Dunu-nawa pegou as flechas, pôs uma faca na cinta e respondeu-lhe:
- Mulher, cozinha aipim e bananas para comermos com o macaco-prego, que vou matar para você.
Assim dizendo, entrou pela mata adentro. A mulher, contente, começou a cozinhar o aipim e as bananas. Quando a água estava fervendo, tirou a panela do fogo e colocou-a no chão, para que a comida esfriasse, ficando à espera do marido.
Enquanto isso, Dunu-nawa, quando entrou na mata, encontrou muitas cobras. Mas não quis matá-las. Foi adiante, cuidadosamente. E avistou uma onça-pintada, que caçara um veado, e estava a cortá-lo em pedaços. Com uma flechada certeira, bem no coração da onça, matou a fera e levou os dois animais para casa.
Quando viu o marido chegando com aquela quantidade de carne, a mulher se alegrou muito. Dunu-nawa lhe disse:
- Pai, esta onça matou o veado, e eu a matei. Cozinhe e coma depressa.
Quando acabou de comer, Pai cortou a carne, que sobrara em pedaços, fez um moquém e pôs a carne para secar. Todos os dias, eles tinham carne para comer.
O tempo foi passando, e Dana-nawa, com saudade das cobras que vira na mata, disse a si mesmo: “Por que não ir matar as cobras? Estou com fome de carne de cobra”. Mas não foi. E o tempo continuou a passar.
Um belo dia, ele disse à mulher:
- Mulher, estou com muita vontade de comer muçu (peixe). Vou ao rio pescar.
Saiu. E, em vez de ir ao rio, foi à mata, onde logo encontrou uma jararaca muito grande, dormindo ao sol. Depois de matar a cobra, cortou-lhe a cabeça e o rabo. Em seguida, cortou-a em pedaços e embrulhou-os em folhas.
Foi para casa. E, assim que chegou, deu o embrulho à mulher, dizendo-lhe:
- Veja que muçu grande que peguei no rio. Cozinhe-o logo.
Pai obedeceu. E Dunu-nawa começou a comer com prazer, pouco depois. Pai achou o cheiro da comida gostoso e começou a sentir vontade de comer também.
O marido percebendo a vontade nos olhos dela, perguntou-lhe logo:
- Quer comer muçu comigo?
- Quero sim. - respondeu-lhe depressa a mulher.
Dunu-nawa deu-lhe um pedaço, e Pai comeu.
- Oh, como é carnudo este muçu. - disse-lhe o marido.
Pai, porém, respondeu-lhe logo:
- Este muçu é catinguento que nem cobra.
- Ora catinguento. Ele é muito gostoso.
Mas a mulher não quis mais saber de muçu. E continuou a comer a carne moqueada, que sobrara da primeira caçada. Por causa disso, o marido ficou muito aborrecido com ela.
Quando a carne moqueada acabou, Pai disse ao marido:
- Minha comida já acabou.
Dunu-nawa pegou as flechas, saiu para a mata. E matou um porco e uma cobra. Tirou a banha do porco, cortou a cobra em pedaços, e embrulhou-os na banha. Quando chegou à casa dele, foi logo dizendo à mulher:
- Minha mulher, matei um porco e trouxe a gordura dele para você. Coma depressa.
Pai, alegre, cozinhou a banha e comeu-a. Mas, junto, comeu também a cobra. E ficou doente. Dormiu noites seguidas. Depois, começou a sentir dores, emagreceu, ficou amarela.
Então, o marido lhe perguntou:
- Pai, por que você emagreceu e ficou amarela?
A mulher lhe respondeu:
- Parece que foi por causa da banha do porco que você me trouxe.
Dunu-nawa começou a rir. E Pai lhe perguntou:
- Meu marido, por que está rindo tanto de mim?
- Você adoeceu porque comeu carne de cobra, junto com a banha de porco. - respondeu-lhe o marido.
Ao ouvir isso, Pai chamou os parentes, para que matassem o marido. Mas o comedor de cobras, que era esperto, fugiu. E Pai morreu, sem ser vingada.