Contam que, certa vez, dois meninos se perderam no meio de uma floresta. Sem ter onde dormir, os coitadinhos ajeitaram-se, mesmo numa grande árvore, bem lá em cima.
Durante a noite, o curupira e sua mulher acenderam uma fogueira embaixo da árvore, onde dormiam os dois meninos. E o curupira e sua mulher esperaram pela manhã.
Assim que o sol nasceu, o curupira e sua mulher disseram aos meninos:
- Desçam daí, meus netinhos.
Sem saber o que fazer, os garotos lhes obedeceram. Fingindo agrado, o curupira e a mulher levaram os meninos para casa. Lá chegando, baixinho o curupira disse à mulher:
- Vou levar o menino mais velho àquele mato, para matá-lo. Enquanto isso, cozinhe aquele outro menino, pois quero comê-lo, quando eu voltar.
Depois de assim dizer, o curupira saiu com o garoto maiorzinho. A velha, então, disse ao menor:
- Meu neto, suba aquela palmeira e apanhe alguns inajás (palmeira que dá frutos em grande cachos, cujo peso é de dezenas de quilos. É uma das mais belas e altas) para mim. Estou com vontade de comê-los.
O menino subiu a palmeira e disse-lhe:
- Ponha a enxada em seu peito, avozinha. Para eu atirar os inajás. Assim ficam mais suculentos.
A velha fez o que o menino dizia. E ele atirou um cacho de inajá com toda a força, fazendo a enxada ferir a velha e matá-la.
Bem depressa, o menino desceu da palmeira e pôs a velha na panela, que estava fervendo no fogo, antes que o curupira chegasse. Quando ele chegou, foi comer da panela e, então, logo soube que estava comendo sua mulher. Furioso saiu à procura do menino, que esmigalhara um espelho. E, enquanto fugia, espalhava os estilhaços pelo mato.
O curupira, desesperado, começou a gritar pela mulher. Os pedacinhos do espelho respondiam. Quando o curupira foi ver de onde vinha a voz, encontrou um pedacinho do espelho. Procurou o menino e viu-o dentro da espata (é a parte do topo das folhas ainda chatas, duras, das palmeiras) da palmeira, lá no alto.
Dizem que ele flechou muitas vezes o menino, mas não o acertou nenhuma vez. E as folhas ficaram todas presas na espata. Então, foi para casa fazer outras flechas. Ai, o menino fugiu com um macaco.
Quando os dois chegaram à beira de um rio, o macaco amarrou uma ponta de sua tripa numa árvore, pulou para a outra margem e disse ao menino:
- Venha pela minha tripa.
O menino foi. Quando chegou à outra margem, o macaco levou-o para a casa de sua mãe, que ficou muito contente, ao vê-lo de volta.