Literatura do Folclore: O rei doente do mal de amores - conto

Havia um casal de pretos velhos que encontrou na rua uma menina enjeitada, muito branquinha e muito bonitinha. Levaram-na para sua casa, criando-a com muito carinho. Mas, como tinham medo de que a tomassem deles, traziam-na fechada num quarto, de maneira que ela nunca via o mundo. A menina não sabia quando era dia nem quando era noite.

Passados muitos anos, quando já ela estava ficando mocinha, um dia, que ficou sozinha em casa, ela pôs uma cadeira em cima da mesa, subiu a cadeira, tirou umas telhas, fazendo um buraco no telhado da casa. E enfiou a cabeça pelo buraco. Ao ver a luz do dia, ficou muito admirada, olhando para tudo.

Pois bem, ali bem pertinho da casa do negro, havia um jardim muito bonito. A mocinha desceu pelo telhado e pulou no jardim, ficando muito espantada diante das flores, coisa que jamais ela tinha visto. Apanhou algumas rosas, tornou a subir o telhado e voltou para o seu quarto.

Quando o velho e a velha chegaram disseram-lhe:

- Que cheiro de rosas, minha netinha.

- Somos nós mesmos, minha avozinha e meu avozinho. - respondeu-lhes a mocinha.

Dali por diante, todos os dias, quando os pretos velhos saíam, a mocinha escapulia pelo telhado e ia para o jardim. Assim, ela fez durante muito tempo.

Até que, um dia, encontrou o rei.

O rei perguntou-lhe quem era ela, o que fazia por ali, como também onde é que ela morava. Ela, então, mentiu para o rei. Disse-lhe que não sabia quem ela era nem onde era sua casa. E ainda lhe disse que estava só passeando.

O rei gostou muito dela. E os dois ficaram conversando até tarde. Diariamente, era a mesma coisa: os dois se encontravam no lindo jardim.

Até que um dia, ela apareceu de barriga. Já estava próximo a ter a criança quando, certa vez, encontrou o rei dormindo. Então, tirou uma medalha que ele trazia ao pescoço, cortou um pedaço do casaco dele, guardou tudo e foi-se embora.

A moça, quando chegou a hora, teve o filho dentro do quarto. A velha, ao ouvir a criança a chorar, disse-lhe:

- Que cheiro de gente nova, minha netinha…

A moça respondeu-lhe:

- Somos nós mesmos, minha avozinha.

E nunca mais a moça foi ao jardim. Por causa disso, o rei caiu doente, apaixonado. Já estava desenganado por todos os médicos, que mandara chamar, quando a mocinha (ela bem que sabia da doença dele por causa de conversas com os dois velhinhos) pôs o filho dentro de uma caixa, com a medalha e o pedaço do casaco do rei, saindo a apregoar pela rua:

- Quem quer comprar flores pra quem está doente de mal de amores.

E foi caminhando, caminhando. Quando passou diante do palácio, chamaram-na. Ela entrou, colocou a caixa em cima da mesa e disse aos presentes:

- Chiii! Esqueci-me de fechar a porta de minha casa. Vou fechá-la e voltarei num instante. Por favor, tomem conta desta caixa.

Saiu e não mais voltou. Depois de muito tempo, ao ver que ela não voltava mesmo, abriram a caixa. Ao ver aquele menino tão gordinho, tão bonitinho, os fâmulos do rei ficaram muito admirados. Correram, então, a mostrá-lo ao rei, que estava de cama. Ele, quando olhou e viu a medalha e o pedaço do casaco que estavam com o menino, reconheceu logo que era seu filho. Num instante, ficou melhor da doença e mandou botar um anúncio em todo o reino, que dizia assim:

                   VEJO O FRUTO E NÃO VEJO A TERRA

Quem adivinhasse o que queria dizer aquilo ganharia um enorme prêmio. Por isso, não houve quem não fosse ao palácio, dizer ao rei o que lhe parecia aquilo. Mas ninguém acertava. Então a moça soube do anúncio. Quando já não havia mais ninguém para ir ao palácio, ela disse ao preto velho:

- Meu avozinho, vá ao palácio, peça para falar com o rei e diga-lhe: “Eu vejo a terra e não vejo o fruto”.

O velho, ao chegar ao palácio, disse ao rei as palavras que a sua neta lhe ensinara. O rei, então, começou a pular de contente, perguntando-lhe:

- Oh, negro. Quem lhe ensinou a lhe dizer isso?

O negro velho, com muito medo, disse ao rei que tinha sido a netinha.

- Pois bem. Amanhã, sob pena de morte, traga a sua neta aqui. - ordenou-lhe o rei.

O negro saiu do palácio muito triste, chorando e pensando que alguma coisa ruim fosse acontecer a sua netinha. Foi chegando a casa, dizendo a netinha:

- Eis aí, minha netinha que você foi me arranjar. Mandou que eu fosse dizer aquilo ao rei, e ele quer que eu leve você ao palácio. Você, que nunca saiu daqui e nunca viu nada…

- Não faz mal, meu avozinho, eu vou - disse-lhe a moça.

No outro dia, bem cedinho, a moça se aprontou. Depois, saiu muito contente por ali a fora, com o negro. Assim que chegaram ao palácio, e o rei a viu, foi dizendo:

- Vejo a terra e vejo o fruto.

Depois, deu o braço à moça e disse à corte:

- Esta é que vai ser minha mulher.

Correram os banhos e, em seguida, casaram-se. E houve um grande festão. Até eu estive lá. Quando voltei, vinha trazendo um prato de doces para vocês, mas levei uma queda, e eles se espalharam pelo chão…

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