Houve um rei que tinha um filho. Quando ele chegou à idade de dezoito anos, sua mãe mandou ver a sua sina. Responderam-lhe que seu filho tinha de morrer enforcado.
Desde esse dia, sua mãe não pôde mas ter alegria. O príncipe logo que notou a tristeza da mãe, perguntou-lhe qual era o motivo de sua tristeza. Mas sua mãe não lhe quis dizer. E o moço, incomodado por esse mistério, também caiu em tristeza.
No segundo dia, tornou a indagar da rainha. E nada dela lhe querer dizer. No terceiro dia, a mesma coisa. Entretanto, o príncipe insistiu tanto que a sua mãe se viu obrigada a declarar a causa de sua tristeza. Disse-lhe que a sua grande tristeza era por causa da triste sina de seu filho morrer enforcado.
Naquele momento, o príncipe não se atemorizou. E disse para sua mãe que, por isso, ela não se incomodasse, porque morrer disso ou daquilo, de moléstia ou enforcado, tudo era morrer e, portanto, que ela lhe desse licença para ele correr o mundo, para não morrer onde tinha nascido, a fim de evitar maior dor a seus pais. Com custo, a rainha lhe concedeu licença. E o moço foi ter com o rei, seu pai, que também, a custo, lhe deu licença.
O príncipe se aprontou para seguir viagem. Na despedida, seu pai lhe deu uma grande soma de dinheiro, para ele se manter em sua viagem.
Depois de ter o moço corrido algumas cidades e reinos, chegou a um lugar onde havia uma capela de São Miguel, com a sua imagem e a figura do diabo. Só que tudo lá na capela já estava muito arruinado. Aí, parou o príncipe, a fim de mandar consertar a capela e as imagens.
Mandou chamar operários. E se pôs à testa da obra. Depois, o mestre da obra veio ao príncipe para lhe dar parte que tinha concluído o trabalho. Mas que tinha ficado um resto de tinta, por causa de ele não ter pintado o diabo.
O príncipe examinou a obra. E lhe ordenou que se pintasse também o demônio. Assim, ao ver tudo terminado, pagou aos operários e, em seguida, retirou-se.
Depois de ter corrido outras terras, foi dar à casa de uma velha. Lá, pediu-lhe licença para pernoitar. E, depois que a velha lhe destinou um quarto, o príncipe foi contar o dinheiro que lhe restava. Foi aí que a velha, vendo o rapaz a contar tanto dinheiro, correu para dar parte à autoridade, dizendo-lhe que um ladrão estava roubando em sua casa.
A autoridade, com uma escolta, se dirigiu à casa da velha e prendeu o príncipe. Conduziu-o para a cadeia, para ele ser processado. E terminou o príncipe sendo condenado à pena última.
Chegando o dia de cumprir a pena, saiu o moço da prisão no meio de uma escolta, para ser conduzido à forca. Mas São Miguel, que estava naquela capela que o príncipe tinha mandado consertar, perguntou ao demônio:
- Ô demônio, você, agora, não está mais bonito?
Respondeu-lhe o diabo que sim.
- E você não sabe quem consertou esta capela e nos enfeitou?
Respondeu-lhe que tinha sido o príncipe, que havia passado por ali e pagou para os operários consertar a capela e a imagem de São Miguel com ele.
- Pois, demônio, aquele príncipe está, neste momento, sendo conduzido, por uma escolta, para ser enforcado. Ele vai cumprir a sentença a que foi condenado injustamente. E, você, deve ir agora mesmo defendê-lo.
Bem ligeiro, o diabo montou num fogoso cavalo e se dirigiu à casa da velha. Conduziu, então, a velha à justiça, onde lá ela declarou toda a maquinação que tinha feito, para ficar com todo o dinheiro do príncipe.
O rei, sabendo do ocorrido, por intermédio do diabo, passou ordem para ser solto o príncipe e conduzido à sua presença. E o diabo era o portador da ordem.
Partiu o demônio no seu cavalo. E apenas teve tempo de chegar, pois o príncipe já estava quase no ato de ser enforcado. Logo, o diabo apresentou a ordem de soltura. E, livre o príncipe, ele o levou ao palácio do rei.
No palácio, o rei interrogou o príncipe, para saber quem era e donde tinha vindo. Ao que ele lhe respondeu justamente quem era e, ainda, lhe disse que tinha saído da terra de seus pais, para não morrer enforcado perto deles, pois essa era a sua sina que tinha trazido.
O rei obrigou a velha a restituir o dinheiro do príncipe e mandou-a levar para a prisão, até chegar o dia de ela ser sentenciada pelo crime que havia cometido.
Assim, o príncipe, depois que se viu livre e embolsado do seu dinheiro, foi caminhando por uma estrada. De repente, ele se encontrou com um fidalgo, montado num fogoso cavalo. O desconhecido fidalgo lhe perguntou para onde ia. E o príncipe lhe respondeu que andava em terra estranha, mas não sabia onde iria pernoitar. Então, os dois foram andando, justamente pelo caminho que iria dar lá na capela, que o príncipe havia mandado consertar.
Durante a caminhada, o príncipe foi contando ao fidalgo o que lhe tinha acontecido e como tinha se livrado daquela vez, mas que a sua sina era de morrer de enforcado. Então lhe disse o fidalgo:
- Você sabe quem foi que defendeu você?
Respondeu-lhe o príncipe que não sabia.
- Pois você fique sabendo que fui eu, pois eu sou a figura do diabo que estava na capela de São Miguel e que você mandou consertar e também mandou me pintar. Aí, quando o Santo me disse o aperto em que você estava, eu montei neste cavalo e consegui chegar a tempo de salvar você. Agora, volte para a sua terra, porque a sua sina está desmanchada. E aquela velha vai ser enforcada no seu lugar.
No instante, o diabo desapareceu. E ele foi para a sua morada, lá na capela, onde também foi o príncipe fazer sua oração. Depois, o príncipe voltou para a sua pátria, onde seus pais o receberam com grande contentamento.