Pela manhã, após a seleção brasileira ter sido derrotada no seu próprio
terreiro, na semifinal da Copa da Fifa, no início de uma inesquecível terça-feira
de julho, pelo placar elástico de sete a hum, para a Alemanha, eu trafegava na
Avenida Castelo Branco com destino ao “shopping” Cariri. Ao parar no semáforo do cruzamento
dessa avenida com a Rua José Marrocos, avistei, diante da escola de ensino
estadual, o vendedor ambulante. Era um senhor de boné, sentado no banquinho, a
aguardar fregueses. Estendidas no varal uma camisa da Alemanha e uma da
Argentina.
Ao meio-dia, passando de volta para casa, avistei-o
ainda naquela mesma condição. Resolvi, então, movido pela curiosidade e mais
estimulado pelo faro literário, encostar o carro perto do ponto do vendedor,
para conversar com ele. Talvez me censurem pela excêntrica atitude, porém a
conversa para quem escreve vale tanto quanto a venda de comerciante.
No entanto, ao me aproximar dele, notei-o
desorientado. Soube logo dele que sua esposa, chateada por ele não obedecer aos
seus conselhos, havia ido para casa. Ela pressentia o marido sofrer violência
física por parte de fanáticos brasileiros, revoltados pela arrogante atitude
antipatriótica do marido. Segundo o vendedor, teve até gente de carro,
ameaçando-o de arrancar do varal as camisas expostas e, ainda, dar-lhe uma cambada
de pau.
- Foi bom, continuou seu desabafo o vendedor, o
senhor aparecer aqui. Um anjo mandou o senhor aqui. Agora, me decido levar essa
mercadoria de volta pra casa. O pior, meu amigo, é que eu estou com monte
de camisa e bandeira pra prestar conta na loja. De manhã, pensei que eu não ia passar
pelo vexame que passei. Estendi essas camisas sem ouvir conselho de minha
mulher. Não passou pela minha cabeça ver o negócio ficar alvoroçado como ficou.
Para terminar a nossa conversa, o vendedor ainda me
revelou esta preciosidade:
- Mas tem problema não, meu amigo. Já sei o que vou fazer: as camisas e bandeiras da seleção do Brasil, que eu deixei elas lá em casa, vou guardar pra eu vender no dia sete de setembro, nos desfiles das escolas. E as das duas seleções, a da Argentina e a da malvada, que são poucas, vou seguir o conselho de minha velha: vamos fazer delas, lá em casa, pano de chão.
JN. Dantas de Sousa, Eurides.